Por José Homero Adabo – Contador, Sócio fundador do Escritório Taquaral Contabilidade e Vice-Presidente Administrativo do Sescon Campinas

Foi publicada no último dia 29/12 a Lei nº 14.789/2023, que trata dentre outras questões, das novas regras para cálculo dos Juros sobre Capital Próprio – JCP, a partir do ano calendário de 2024.

Antes de passarmos às alterações, é preciso registrar que a figura do JCP, como redutora da base de cálculo do IRPJ e CSLL, somente é válida para os contribuintes optantes do lucro real. Eles contam com a opção de deduzir o valor pago ou creditado no ano aos sócios ou acionistas, recolhendo apenas 15,0% de IR, com o abatimento de 34,0%, que é a alíquota cheia do IR. Os demais contribuintes estão fora desta regra.

Os juros sobre capital próprio, como valor dedutível para fins do IRPJ/CSLL é uma das maneiras de reduzir as distorções do regime de lucro real entre os contribuintes que estão endividados (estes podem abater os juros pagos sobre os empréstimos) e aqueles que são mais cuidadosos e preferem fazer uso de recursos próprios no desenvolvimento de suas atividades operacionais. Se fosse abolida esta figura, como cogitava as autoridades econômicas, haveria muito mais incentivos tributários para as empresas endividadas que as mais sadias, o que reduziria enormemente a eficiência produtiva da economia brasileira.

A figura jurídica do JCP foi criada em 1º de janeiro de 1996, por meio da Lei nº 9.249/1995, Art. 9º, que permitia e ainda permite, para fins de apuração do lucro real, a dedução dos juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do Patrimônio Líquido (PL). O que muda agora é que as contas do PL, autorizadas a compor a base de cálculo do JCP, passa a ser reduzida.  O JCP continua sendo calculado pela aplicação da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), limitada à taxa pro-rata die, sobre as contas do PL, agora em novas bases.

Vamos então às modificações a vigorar a partir de 01.01.2024. Para facilitar a visualização e melhorar a compreensão, segue abaixo um quadro sinótico.

Antes da Lei nº 14.789/2023Após a Lei nº 14.789/2023
Lei nº 9.249/1995 Art. 9º A pessoa jurídica poderá deduzir, para efeitos da apuração do lucro real, os juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP. (Vide Lei nº 14.789, de 2023).Lei nº 9.249/1995 Sem alterações
§ 1º O efetivo pagamento ou crédito dos juros fica condicionado à existência de lucros, computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros, em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados. (Redação dada pela Lei nº 9.430, de 1996). (…)Sem alterações
§ 8º  Para fins de cálculo da remuneração prevista neste artigo, serão consideradas exclusivamente as seguintes contas do patrimônio líquido: (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014) I – capital social; (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014) II – reservas de capital; (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014) III – reservas de lucros; (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014) IV – ações em tesouraria; e (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014) V – prejuízos acumulados. (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014). (negritamos).§ 8º ………………………………………………………. I – capital social integralizado; II – reservas de capital de que tratam o § 2º do art. 13 e o parágrafo único do art. 14 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976; III – reservas de lucros, exceto a reserva de incentivo fiscal de que trata o art. 195-A da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976; ……………………………………………………… V – lucros ou prejuízos acumulados. (negritamos).
 Acrescentado ao Art. 9º da Lei nº 9.249/1995, pela Lei nº 14.789/2023
 § 8º-A. Para fins de apuração da base de cálculo dos juros sobre capital próprio: I – não serão consideradas as variações positivas no patrimônio líquido decorrentes de atos societários entre partes dependentes que não envolvam efetivo ingresso de ativos à pessoa jurídica, com aumento patrimonial em caráter definitivo, independentemente do disposto nas normas contábeis; e II – deverão ser considerados, salvo os casos em que for aplicado o disposto no inciso I deste parágrafo: eventuais lançamentos contábeis redutores efetuados em rubricas de patrimônio líquido que não estiverem previstas no § 8º deste artigo, quando decorrerem dos mesmos fatos que deram origem a lançamentos contábeis positivos efetuados em rubricas previstas no referido parágrafo; evalores negativos registrados em conta de ajuste de avaliação patrimonial decorrentes de atos societários entre partes dependentes.

Uma alteração importante diz respeito à exclusão da base de cálculo para a determinação do JCP das ações em tesouraria, que estava permitida desde 1º de janeiro de 2015.

As reservas de capital e reservas de lucro também sofreram reduções da base de cálculo. Agora, apenas as seguintes reservas de capital poderão ser utilizadas para fins do cálculo do JCP: (a) o valor da contribuição do subscritor que ultrapassar o valor nominal das ações e (b) parte do preço de emissão de ações que for definido como destinado à formação de reservas de capital.

Em relação às reservas de lucros, a nova lei excluiu da conta o valor das doações ou subvenções governamentais para investimentos.

Todas estas alterações implicam na redução do valor da base de cálculo para a determinação do JCP, o que diminui o valor dedutível do IRPJ e da CSLL e com isso, os contribuintes pagarão mais impostos a partir de 01.01.2024.

A inclusão do § 8-A ao Art.  9º da Lei nº 9.249/1995, pela Lei nº 14.789/2023, trouxe ainda as seguintes alterações em seus incisos I e II, para o cálculo do JCP:

  • Inciso I – Excluiu a possibilidade de acrescer à base de cálculo do JCP da controladora o valor da equivalência patrimonial decorrente dos lucros auferidos em sociedades controladas, das quais a controladora seja sócia. Aqui a justificativa é que o ganho de equivalência patrimonial não representa um efetivo ingresso de ativos à pessoa jurídica, com aumento patrimonial em caráter definitivo.
  • Inciso II – A única rubrica que não estará mais prevista no § 8º, do Art. 9º da Lei nº 9.249/1995, com as modificações da Lei 14.789/2023, é o antigo inciso V – Ações em Tesouraria. Portanto, se houver saldo nesta conta após 01/01/2024, além do seu valor não poder mais ser considerado para fins de base de cálculo do JCP, o contribuinte deverá deduzir o seu montante para o cálculo das novas bases do JCP no futuro, quando houver baixa das Ações em Tesouraria. Pode não ter muito sentido, mas é a interpretação possível neste momento do inciso II, letra “a” do § 8-A acima.

A grande novidade da medida é que a partir de 2024 não serão mais consideradas na composição da base de cálculo do JCP as variações positivas no patrimônio líquido decorrentes de atos societários entre partes dependentes, que não representem efetivo ingresso de ativos à pessoa jurídica, com aumento patrimonial em caráter definitivo.

Em suma, são estas as modificações trazidas pela nova lei para o cálculo do valor dos Juros sobre Capital próprio. Pode parecer pouca coisa, mas o efeito do aumento de arrecadação esperada já é comemorado pelo governo, tendo maior incidência nas médias e grandes empresas, menos endividadas e que fazem uso do instituto do JCP.

Sobre o autor:

José Homero Adabo – Vice-Presidente Administrativo do Sescon Campinas, Contador pela PUC-Campinas (1989) e Mestre em Ciências Sociais pela Escola de Sociologia e Política de S. Paulo – Inst Complementar da USP (1980). Técnico em Contabilidade (1970), Especialista em Direito Tributário pela Escola de Direito de S. Paulo – FGV/SP (2020). Professor de Contabilidade e Economia da PUC-Campinas (1975-2009). É sócio fundador de Escritório Taquaral Contabilidade, em Campinas – SP. Conselheiro Efetivo do CRC/SP (2002-2005). CV: http://lattes.cnpq.br/2767906665796192